Kaleem foi no centro da cidade num sábado. Sábado é dia de fazer compras no centro de Nijmegen. Ele ia comprar, entre outras coisas, uma sacola de compras. Mas, por via das dúvidas, só pra garantir, saiu de casa com uma sacola preta de compras na mão. Uma sacola que tava aí, não se sabe de quem era. Essas coisas de república, que acabam sendo vistas como sendo da casa, não da propriedade de algum morador. Primeiro de tudo, foi numa loja que vende bolsas e sacolas de compras. Achou uma sacola que lhe agradou e foi pagar. A moça do caixa reparou na sacola preta na mão dele. Elogiou a sacola. Kaleem deu a bolsa pra ela. Agora ele tinha uma sacola melhor, não precisava mais da preta. Em retribuição, a moça convidou o Kaleem pra jantar. Kaleem conheceu o marido e os filhos da moça e agora tem mais amigos em Nijmegen que quando chegou.
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Hayat tava na B.00.74, pensando em como chegaria na minha casa, praquela lendária feijoada. Pediu que eu anotasse o endereço num papel, e eu escrevi o nome da rua no papel que ela me deu. Isabelle lembrou que o ponto de ônibus em que ela precisava descer tem nome, e ofereceu de anotar também o nome do ponto. Hayat deu a lapiseira e o papel pra Isabelle. Quando pousou o grafite sobre o papel, Isabelle percebeu que era uma lapiseira e não uma caneta, e exclamou, surpresa e sempre sorridente, que aquilo era muito legal. Hayat deu a lapiseira pra Isabelle. Isabelle ficou sem graça, não, veja bem, eu só me surpreendi, eu não quero a lapiseira, mas não teve jeito. Hayat insistiu e Isabelle ficou com a lapiseira.
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Kaleem foi a uma discoteca em Nijmegen. Não bebeu álcool, porque a religião dele não permite. Não ficou com nenhuma garota, porque a religião dele não permite. Mas ele se divertiu até não mais poder. Quando resolveu voltar pra casa, foi até a sua bicicleta e a destrancou. Uma guria bêbada veio até ele e comentou que não tinha luz na bicicleta dela. (Andar de bike sem luz dá multa aqui.) Kaleem não teve dúvidas: desencaixou a luz da bicicleta dele e a deu pra menina. A menina agradeceu e foi embora. Logo em seguida, ela voltou, com a luz na mão estendida. Não é certo, toma a tua luz de volta. Cê não precisa dela? Kaleem respondeu que sim, que precisava da luz, mas que ele compraria uma nova luz no dia seguinte e poderia muito bem pedalar até em casa sem luz. E se a polícia te pegar? É um risco que eu corro.
Paquistão e Irã são lugares que a gente não conhece, mas imagina que tenham tanta pobreza quanto no Brasil. Aí, essa generosidade dos dois parece ser a coisa mais natural do mundo: quem tem pouco, divide o pouco que tem e se alegra com o contentamento dos outros.
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