sábado, março 31, 2007

Construções causativas

Não sei se é esse mesmo, o nome das coisas que eu vou apresentar em seguida. Só sei que andam me chamando atenção faz um tempo. São aquelas frasezinhas que brilham como vaga-lumes depois da chuva do entardecer. E a gente só lembra que tinha uma luzinha ali. E quando vê outra, lembra daquela primeira, e quando vê outra, se pega contando luzinhas no mato.

O meu primeiro vaga-lume foi:
1) Eu não consigo sair o carro da garagem.

Aí apareceu outro:
2) O carro do João furou o pneu.

Aí reparei que quando holandeses falam inglês, eles raramente usam o verbo teach, e preferem usar learn:
3) In 2 weeks we learn the kids how to behave in traffic.
Em 2 semanas nós aprendemos as crianças como se comportar no trânsito.

Daí ouvi o gago americano dizer no workshop:
4) The dinossaur is flying a kite.
O dinossauro está voando uma pipa.

Daí então fui estudar que coisa é essa, que a galera chama de tópico, e me deparei com exemplos como:
5) Aí ele pifou o freio de mão do carro e teve que levar o carro na oficina.
6) Essa bolsa some as coisas aqui dentro.

Por fim, lembrei das clássicas de Sampa:
7) Olga vai operar o pé semana que vem.
8) Magy vai aposentar ano que vem.

O que estes exemplos têm em comum, é o que eu acho que é chamado de construção causativa. A receita é simples: verbos intransitivos (sair, voar, pifar, sumir) são usados transitivamente. A sensação de estranheza é causada pelo fato de haver o processo como resultado. O processo de tirar o carro da garagem tem como resultado a saída do carro. Empinar a pipa tem como resultado que ela voe, e assim adiante. Em vez de descrever o processo, vai-se direto ao resultado.
Os outros verbos não são intransitivos, pois requerem pelo menos duas partes envolvidas na ação:
alguém (agente) que fure o pneu (paciente),
alguém (agente) que aprenda a se comportar no trânsito (tema),
alguém (agente) que opere o pé (paciente) da Olga e
algo ou alguém (paciente) que a Magy (agente) vai aposentar.
A receita se complexifica: é possível adotar várias estratégias, mas o princípio básico é alterar a lógica de agente e paciente. Ou o agente simplesmente cai fora (como em 2) e 7)), ou o agente vira paciente, (como em 3)) ou o paciente simplesmente cai fora, (como em 8)).
Conclusão: A gente somos muito paciente.

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