Só que o número que ele fez as pessoas anotarem é idêntico ao meu número de telefone.
O meu telefone vive tocando e eu, inocente, achando que é pra mim, preciso sempre explicar pra mulherada que eu não sou Ricky, nem mesmo conheço nenhum Ricky, que sim, esse é o número que você discou, mas eu sinto muito, eu sou só a Lou.
Depois do primeiro engano eu até me senti altamente capaz de conversar com alguém que fala holandês, mas entende alemão e inglês - pelo telefone. Pois é, porque eu já saquei que não basta saber cumprimentar as pessoas, saber agradecer, dar bom-dia. É preciso ser capaz de entender o que as pessoas respondem, porque normalmente elas falam alguma coisa. E algumas vezes, elas dizem alguma coisa, no meio de tanta coisa que falam! Bom, eu entendi, de primeira, que ela tinha ligado errado. Entendi as palavras, não o somente o contexto. Uau!
Acontecia da mesma mulher ligar duas vezes no mesmo dia. Aí eu entendia que ela me dizia em holandês que já tinha tentado aquele mesmo número de manhã. Eu não só reconhecia a voz dela, como também entendia o que ela estava dizendo!
Mas agora, toda vez que o telefone toca, eu tenho pena da mulherada que procura pelo Ricky e tenho raiva do Ricky, que deve ser disléxico.
Consigo imaginar alguns rostos praquelas vozes femininas. Algumas devem ser bonitas, outras querem ser bonitas, e no fim das contas, todas são iguais. Todas as mais novinhas devem ser loiras, magras e sorridentes, porque afinal, esperam ouvir a voz do Ricky. As mais velhas devem ser parentes distantes. A tia que mora em outra cidade, a vó que sente saudades do pequeno Ricky e a cunhada que precisa de um dinheiro emprestado. As vozes que não transmitem essa expectativa adolescente e febril de falar, depois de tanto olhar pro telefone, com o Ricky, devem pertencer à agente de viagens, à operadora de telemarketing, à funcionária da sapataria ou à moça que divulga o jornal regional e tenta vender assinaturas pra qualquer um.
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